terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Reflexo de Bicho

"Vi! Eu vi! Eras tu! Eras mesmo tu!"
Dizia um Homem enquanto apontava para o seu reflexo...
Encostou o dedo ao espelho..
Empurrou com força! Com mais força...
 Nada!
Só no cinema se consegue fundir a realidade e o reflexo...
" Porra! Tenho que ser Eu outra vez.
 Estúpido reflexo, nada fazes, nada mais que a mera representação, tenho que fazer tudo por ti! Nem um movimento nasce da tua iniciativa, imitador! Barato, sim! Imitador Barato!
Não te cansas de não poderes ser nada mais que aquilo que te ordeno. Todos os dias, aproximo-me e lá vens tu, cada vez mais perto a espreitar o que faço, a troçar repetidamente de mim.
Não és nada!
Amanhã serei tédio e tédio serás!
 Serei grande apenas longe de ti, sempre que apareceres, seja no espelho, na montra, no carro polido... serei apenas uma pequeníssima mostra de mim. Um dia comigo será mais enfastiante que a tua solidão!
Vai procurar outro mais interessante que eu e tu!"
Aproximou-se novamente do espelho, espreitou por um lado, espreitou por outro...
"Ei! Estava a brincar! Anda cá! que eu quero me pentear..."

Bicho

Certeza de Bicho.

Há algo estranho na paixão dos Homens.
Agora e anteriormente, sempre que o Ibrahim anda enamorado, fico confuso!
Pois se por um lado, o vejo feliz nos seus sentimentos...
 Aquilo que sinto, provoca em mim uma certa tristeza..
Curioso, não é? Mas sempre que comunico com o seu coração, o que sinto é... uma insegurança, o pânico do não, a incerteza com que move a vontade.
Simultâneamente, uma capacidade de crer em tudo! Vê em tudo a possibilidade infinita!
Essa mistura de sentimentos conseguiu criar em mim um sentimento que só o sinto através do Ibrahim. Descrevi o que sentia e o como resposta deu-me o nome do sentimento: Angustia.
Engraçado que é mesmo a única forma de o sentir. Fiz testes, simulei sentimentos em mim, como quando leio... Mas nada! Só através do Ibrahim apreendi e sinto a angustia!
 Há uns anos o Ibrahim entrou em casa... Desenrolei-me de bola em sobressalto! Pois mesmo a dormir, ao Ibrahim, sinto-lhe tudo! De imediato grunhi dor e os seus olhos leram nos meus, era a sua dor que grunhia e não a minha. Reconfortou-me de imediato. " Ah! Ah! Bicho não te preocupes... Estou a ver que já sentiste que fui flechado pela paixão! Estava em duvida se o estaria, confirmaste-o! Obrigado!"
Na altura ainda fiquei mais confuso. Que sentimento estranho este, provoca sorrisos na expressão e dor no coração...
Ao sentir aquela orgia de sentimentos no Ibrahim, compreendi, que essa dor é provocada pelo enchimento de sentimentos, como se o volume de sentimentos fosse maior que o espaço disponibilizado para os mesmos.
Defini angustia como o sentimento entre a vontade e a concretização, a tristeza de se deixar de ser dono de si, de não controlar suas vontades, pois é assim o Ibrahim apaixonado. Suponho que os outros homens também, mas a leitura permanente do sentimento do Ibrahim permite-me uma melhor compreensão.
O confuso que fico agora não tem exactamente a ver com o sentimento, como a primeira vez que a senti. Agora confunde-me a hesitação dos Homens na expressão do seu sentimento. Em nós essa individualidade de sentimento não nos é permitida, e a verdade comunica-se por vontade, o meu sentimento pertence-nos...
Para que serve a duvida se não se procurar a certeza.

Bicho

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Bicho Três

Um Homem finalmente encontrou o seu caminho...
Arrependeu-se do seu passado, visitou os locais onde antes houvera roubado e mentido para reposição das suas acções.
Entrou numa aldeia, onde tinha roubado o sino do adro.
Lá chegado, sabendo que os habitantes o desconheciam como perpetrador do acto, procurou trabalho junto dos mesmos...
Apenas uma casa, não aceitou o seu trabalho...
Ajudou nas colheitas, calcou as uvas, varreu as eiras, espalhou o milho, limpou fachadas, caiou as casas, montou os fornos, arranjou telhados... A aldeia nunca tinha estado tão bonita. Até os canteiros! Nunca estes tinham estado tão floridos...
Pediu a todos que se reunissem no adro.
Todos se reuniram, era um pedido do Homem que a todos ajudara.
Lá chegados, o homem contou a sua história. Todos se comoveram com a história do ladrão que se tinha redimido e agora ajudava o outro. Ainda mais se comoveram quando este destapou um sino igual ao que houvera roubado anos antes. Comprado com o suor da ajuda que tinha dado.
Mas logo o velho da casa que não permitiu sua ajuda, veio até o adro e disse:
"Em nada vale a tua acção! Quem entrou em vossas casas foi um Homem com vontade de trabalhar, foi Homem consumido pela sua culpa, que se forçou a redenção. Diz me Homem. Se a tua culpa te obriga a reposição porque não foste sincero connosco? Quiseste com os actos de um Homem bom, o perdão ao Homem mau!"
O Homem pegou no sino e levou-o. Os aldeões deixaram no ir...

 Passado um ano, o Homem entra na aldeia. Chega ao adro e grita:
"Eu sou o Homem que vos roubei, que vos pilhei o bronze do vosso sino, duas vezes!
 Sou hoje um homem novo e pretendo a redenção dos meus pecados...."
O velho aproximou-se e perguntou-lhe:  "Achas que consegues arranjar o meu telhado?"

Bicho